
Na quinta do tio Tomásio vivia um gato chamado Hipólito de pêlo castanho-escuro e olhar matreiro, esverdeado. Alguns animais não gostavam dele, achavam-no muito insolente e preguiçoso. A sua melhor amiga era a raposa Espertalhona, juntos inventavam mil e uma travessuras só para arreliarem os outros animais.
Um dia, o tio Tomásio foi dar uma arrumação ao celeiro que bem precisava de ser limpo e arrumado e dentro de um velho armário pintado de verde encontrou uma antiga gaiola de alumínio. Como sabia que o canário Amarelo tinha a dele já muito estragada perguntou-lhe se queria aquela.
- Quero, quero! – afirmou o canário, entusiasmado.
- É antiga mas está em bom estado. Eu pinto-a da cor que tu mais gostares e vai ficar bem bonita.
- Muito obrigado, tio Tomásio, estava mesmo a precisar de uma gaiola nova. Gostava que ficasse toda branquinha!
No dia seguinte, o dono apareceu com a gaiola toda pintadinha de branco, abriu a porta e disse, satisfeito:
- Já aqui tens a tua casa nova, Amarelo. Anda, entra!
O Amarelo ficou encantado, tinha comedores e bebedores novos também! E lá ficou pendurada num dos troncos do castanheiro que ficava à entrada da quinta. E o canário cantava, cantava o dia inteiro, muito feliz.
Dias depois, o gato Hipólito ao passar por ali viu o Amarelo à porta da gaiola.
- Olá, então agora tens uma casa nova, Amarelo?
- Tenho! Agora já não me poderás aborrecer, estou mais alto, vês? – e saltou para o poleiro.
- “Isso é o que julgas…” – pensou o gato, manhoso. Fingindo que se afastava, deu a volta ao castanheiro e sentou-se a pensar. Havia de descobrir uma maneira de subir até à gaiola. Um dos seus maiores prazeres era assustar o pobre do canário Amarelo.
- Já sei! Vou pedir ajuda à raposa.
E ela disse-lhe:
- É preciso uma escada, só com uma escada conseguirás chegar à gaiola.
- Boa ideia, raposa! Como é que eu não pensei nisso?
- Ora, porque não és inteligente como eu! – respondeu a raposa, vaidosa.
- E tu tens a mania que és muito esperta, não tens? – zangou-se o gato.
Começaram a discutir.
- Agora já não quero a tua ajuda para nada. Adeus!
E virou costas, muito arreliado.
Pelo caminho pensava onde iria encontrar uma escada que tivesse muitos degraus. A capoeira das galinhas ficava mesmo ao lado do castanheiro, por baixo da gaiola do Amarelo. O gato Hipólito pôs-se a olhar e sorriu olhando para cima.
- Vai ser uma grande brincadeira e um valente susto que vou pregar ao Amarelo.
Correu para o celeiro e depois de muito procurar encontrou uma escada muito alta e pesada. Nunca iria conseguir tirá-la do celeiro, sozinho.
- Que maçada! A quem hei-de pedir ajuda? À raposa, não! Talvez peça ajuda ao burro Anacleto, ele é tão burro que não vai desconfiar de nada! Boa!
O burro olhou-o espantado.
- Colocar uma escada em cima da capoeira das galinhas?
- Sim, ajudas-me?
- Mas para que queres tu uma escada em cima da capoeira? – perguntou o Anacleto que não era tão burro como o gato pensava.
- É para fazer uma surpresa ao Amarelo. A minha intenção é boa, não te preocupes! – garantiu.
- Que género de surpresa? – perguntou o burro desconfiado.
- Já me estás a aborrecer com tantas perguntas! Ajudas-me ou não?
- Antes terás que me dizer para que queres a escada. – insistiu o Anacleto.
- Eu não tenho que te dizer nada! Adeus! – e afastou-se furioso.
- “A mim não me enganas tu…” - pensou em voz alta o Anacleto.
Entretanto, o gato sentou-se na relva do jardim, desanimado.
- Tenho que encontrar alguém que me ajude, mas quem?
A raposa avistou-o e aproximou-se dele.
- Então, já encontraste alguma escada, Hipólito?
- Já, mas não tenho quem me ajude a colocá-la em cima da capoeira das galinhas.
- Bem, se quiseres posso ajudar-te… - ofereceu-se a raposa.
O gato olhou para ela e pensou que não tinha mais ninguém.
- Aceito a tua ajuda se não me aborreceres com os teus ares de espertalhona!
A raposa sorriu abanando o rabo farfalhudo.
- Está bem. Agora mostra-me onde está a escada.
- Está no celeiro, anda!
Enquanto isso, o Anacleto desconfiado das boas intenções do gato Hipólito, foi falar com o tio Tomásio.
- Uma escada? E para que quer ele uma escada? - perguntou o dono da quinta.
- Não me quis dizer, mas eu julgo que seja para assustar o canário Amarelo.
- Eu tiro-lhe a mania de andar a pregar sustos ao Amarelo! Um dia destes ainda o expulso da quinta! – proferiu o tio Tomásio, zangado. – Vamos lá fora ver o que se está a passar.
Tendo o cuidado de não se aproximarem demasiado do castanheiro, viram o gato Hipólito ajudado pela raposa Espertalhona a colocarem a escada em cima da capoeira das galinhas.
- Logo à noite, quando todos estiverem a dormir vamo-nos divertir tanto, Espertalhona! – dizia o gato.
O tio Tomásio moveu a cabeça, afirmativamente.
- Nem imaginas como te vais divertir, gato manhoso! – sussurrou.
Quando o Sol se escondeu dando lugar à Lua o Anacleto foi colocar um alguidar com água gelada ao lado da escada. Depois, dirigiu-se à casa da raposa Espertalhona.
- O tio Tomásio quer falar contigo, raposa.
- Comigo? Mas porquê?
- Não sei, é melhor vires comigo – aconselhou o Anacleto.
“Será que ele desconfia de alguma coisa?” – pensou ela assustada – “o tio Tomásio quando se zanga não é para brincadeiras”.
Já em casa do dono da quinta, ele começou a fazer-lhe perguntas.
- Ora diga-me lá, Dona raposa: a que horas combinou encontrar-se com o seu amigo gato?
A raposa atirou um pulo!
- Como é que o tio Tomásio sabe? – defendeu-se, aflita – Eu não tenho culpa de nada, ele é que me obrigou…
- A que horas, raposa? – insistiu o Anacleto.
- Ele deve estar a chegar, não sei…
O tio Tomásio levantou uma ponta da cortina da janela da sala. Lá estava ele a passear de um lado para o outro, impaciente.
- Onde se teria metido a raposa? Já cá devia de estar, eu bem sabia que não podia confiar nela! – resmungou.
- Anacleto, já sabes o que tens a fazer – disse o tio Tomásio.
A raposa perguntou baixinho:
- O que é que vocês vão fazer?
- Já vais ver, raposa.
Lá fora, o Hipólito ficava cada vez mais impaciente.
- Não espero mais pela raposa! Quem me manda confiar naquela mentirosa? – e começou a subir a escada.
Quando estava quase a alcançar a gaiola do canário Amarelo, o Anacleto começou a abanar a escada.
- Ai, quem está a abanar a escada? És tu raposa malvada? Ai, ai que eu caio!
Por fim, desequilibrou-se e caiu dentro do alguidar onde estava a água gelada.
- Socorro! Eu não sei nadar, ajudem-me! A água está gelada, socorro!
O Amarelo que adormecera cedo, acordou sobressaltado.
- Que barulheira é esta? – perguntou ainda ensonado.
O tio Tomásio tirou o gato Hipólito do alguidar e repreendeu-o, severamente.
- Não tens vergonha de estares sempre a assustar o canário Amarelo? Que este banho gelado te tenha servido de lição! Da próxima vez, o castigo será maior.
- Ai, que vergonha… Atchim…atchim… Sua traidora! – acusou, olhando para a raposa.
- Não foi ela – riu o Anacleto – fui eu que avisei o tio Tomásio. Pensavas que eu era burro? Sou burro mas sou inteligente.
- Fiquem sabendo que não hesitarei em expulsar os dois se insistirem com as vossas diabruras, ouviram? A Dona raposa já devia saber comportar-se desde aquela noite em que foi roubar amoras! – ralhou o dono da quinta.
Ela encolheu-se a um canto, envergonhada.
E o gato Hipólito com o pêlo eriçado e gelado até aos ossos tremia muito e espirrava ainda mais.
- Atchim…atchim…
O Amarelo voou para o ombro do tio Tomásio e acusou:
- Com que então querias assustar-me, não era? Bem feito!
O gato respondeu-lhe de mau humor:
- Não me aborreças!
Meteu o rabo entre as pernas e foi para casa a tremer e a espirrar.
- Atchim! Atchim…atchim…
Não parou de espirrar durante dois dias. Embrulhado num cobertor, com as patas traseiras mergulhadas numa bacia com água quente, o gato Hipólito jurou que nunca mais se envolveria em outra confusão.
Maria Manuela Amaral

Os gatos são uns malandros, mas como todos os malandros lá lhe chegou uma lição.
ResponderEliminarFantástica
Beijos
não gosto de gatos ,mas a história está muito bem contada ,como sempre uma linda e boa imaginação beijossssss :-)
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