sexta-feira, 18 de março de 2011

NA QUINTA DO TIO TOMÁSIO - O ENSAIO


O tio Tomásio tinha no seu quintal uma capoeira com seis galinhas. Cada uma delas punha dois ovos, por dia. Com os doze ovos diários que recolhia, todas as manhãs, para dentro de uma cesta de verga a sua esposa, Dona Antónia, fazia deliciosos bolos juntando açúcar e farinha e fruta. Guardava os restantes ovos em caixas de papelão.
De dois em dois dias, o tio Tomásio mudava-os para a cesta de verga e ia vendê-los à feira. Com o dinheiro da venda comprava outros alimentos que lhes eram necessários.
Certo dia, quando a Dona Antónia estava a amassar um dos seus bolos ouviu um cão a ladrar lá fora. Desviou a cortina da janela da cozinha para ver o que se passava. “Ora esta!” – resmungou.
O cão estava a ladrar mesmo em frente à capoeira das suas galinhas e estas esvoaçavam assustadas, de um lado para o outro.
- Có-có-ró-có! Có-có-ró-có!
O tio Tomásio que estava a tratar da horta, foi a correr ver o que se passava e quando viu o cão que continuava a ladrar de um modo muito estranho, disse:
- Ó Doc, não ladres aqui junto das minhas galinhas, não vês como estás a assustá-las? Assim, elas nem põem os ovos que me fazem tanta falta. Pára de ladrar!
O cão olhou-o muito aborrecido e protestou:
- Está bem, pronto! Eu vou-me embora, mas que maçada!
As galinhas sossegaram e a Dona Antónia continuou a amassar o bolo, abanando a cabeça.
No dia seguinte, eram sete horas da manhã, lá andavam as galinhas alvoroçadas, de novo, dentro da capoeira.
- O que será agora? – inquiriu o dono da quinta olhando para a esposa.
- Escuta! – disse ela – não ouves um gato a miar?
Ele dirigiu-se ao quintal e não era que estava mesmo um gato a miar sentado num banco, virado para a capoeira?
- Mas que ousadia! – pensou o tio Tomásio indignado.
Aproximou-se do gato e disse-lhe de mau humor:
- Ouve lá, não podes ir miar para outro lado? Não vês que estás a espantar as minhas galinhas? Sai já daí!
O animal olhou-o esticando o pescoço e respondeu orgulhoso com o pêlo todo eriçado:
- Eu não sou um gato! O senhor não sabe reconhecer uma verdadeira gata? Em segundo lugar, as suas galinhas são umas parvas e ignorantes porque não sabem admirar o valor de uma grande artista!
Dizendo isto, saltou para o chão com muita elegância e afastou-se com o rabo no ar, altiva.
O tio Tomásio cruzou os braços e resmungou:
- Não querem lá ver isto? Mas agora é todos os dias a espantarem as minhas frangas com cantorias estranhas, ora esta!
Quando entrou em casa encontrou a Dona Antónia a rir-se.
- O que é que foi, mulher?
- Com que então o meu Tomásio não sabe reconhecer uma verdadeira gata, hem? – brincou, rindo à gargalhada.
- Não brinques com coisas sérias – refilou, não achando graça nenhuma.
Após três dias, quando estavam a merendar sentados na sala de jantar, ouviram um lobo a uivar. Levantaram-se a correr e foram espreitar à janela. O tio Tomásio olhou para a esposa e exclamou:
- Ai mulher, que estamos bem arranjados da vida! Desta vez, o caso é mais sério.
- O que é que foi? Daqui não consigo ver, só oiço um uivar estranho.
- Pois é isso mesmo, Antónia, está um lobo a uivar mesmo ao lado da capoeira das nossas galinhas!
- E agora, o que vamos fazer? – perguntou ela assustada.
- Vou lá fora tentar convencê-lo a ir-se embora.
- Tem cuidado que ele pode ficar furioso, homem! Uiva de uma forma tão esquisita que só de o ouvir fico toda arrepiada!
O tio Tomásio pegou no chapéu e saiu para o quintal. Nesse instante, reparou que eram dois lobos. Desta vez, as galinhas estavam encolhidas a um canto da capoeira e nem o bico abriam.
O dono aproximou-se dos lobos, devagarinho.
- Boa tarde Lobos, eu queria pedir-lhes o favor de não comerem as minhas galinhas. Elas fazem-me tanta falta.
Porém, os lobos pareciam que nem o tinham ouvido e continuaram a uivar como se a presença do dono da quinta lhes fosse indiferente.
- Se vocês insistirem em levar os meus animais eu serei obrigado a defender-me! – gritou o tio Tomásio, desesperado.
Os lobos calaram-se, olharam um para o outro e sorriram.
- Mas quem é que lhe disse que nós queremos levar as suas galinhas? – perguntou um deles.
- Nós não estamos aqui para fazer mal a ninguém. – exclamou o outro.
O dono da quinta olhou para eles sem perceber nada. Se não queriam as suas aves o que estariam ali a fazer, uivando daquela maneira? Uma delas ouvindo o que os lobos disseram acercou-se da rede da capoeira, cautelosa.
- Mas então…afinal, o que querem daqui? - perguntou intrigado.
- É melhor explicar tudo. – disse um dos lobos.
- Claro, concordo – respondeu o outro – senão ele pensará que somos esses animais cruéis que as pessoas dizem que somos.
O tio Tomásio olhava-os desconfiado.
- Vamos explicar tudo. Daqui a dois dias haverá uma grande festa na quinta para festejar o aniversário da Dona Cegonha. E como nós fazemos parte do coro, estamos a ensaiar as nossas músicas, percebe?
- Uma festa na quinta? – perguntou boquiaberto – Mas então…agora percebo porque é que nos últimos dias estiveram aqui uma gata e o Doc a cantar…
Os lobos sorriram, entusiasmados.
- São os dois artistas principais da festa! Não sabíamos que eles também tinham vindo ensaiar para o seu quintal.
- Pois vieram, mas eu mandei-os embora porque assustaram as minhas aves e elas deixaram de pôr os ovos que me fazem tanta falta!
As galinhas juntaram-se todas ao pé da rede da capoeira a ouvir a conversa, muito felizes porque ia haver uma festa na quinta.
- Nesse caso, pedimos desculpa – disse um dos lobos – não sabíamos que estávamos a prejudicá-lo. Sendo assim, vamos ensaiar para outro lado.
- Obrigado pela vossa compreensão – agradeceu o tio Tomásio – prometo-vos que no dia da festa a minha esposa fará um grande bolo para oferecerem à vossa amiguinha Cegonha. Mas terão que vir buscá-lo.
- Muito obrigado, é muito simpático. E também podem vir à festa!
As galinhas deram pulos de alegria.
- Sim! Sim! Sim, tio Tomásio! Podemos ir?
- Vou pensar no assunto – prometeu o tio Tomásio a sorrir enquanto os lobos se afastavam, satisfeitos.
Quando o dia da festa chegou os animais deliciaram-se com um grande bolo de laranja que a Dona Antónia tinha confeccionado de véspera.
Colocaram-no no centro da mesa feita de folhas secas, enfeitada com pinhões e avelãs e todos juntos cantaram os “Parabéns a você” à Dona Cegonha que até chorou de felicidade.
Nunca tivera uma festa de Aniversário tão bonita!

Maria Manuela Amaral

1 comentário:

  1. Parabéns a você para a Manelita que tem uma quinta fantástica...estas histórias são o máximo.
    Um ainda as vou contar aos meus netos...
    Beijos

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